A relatividade de Einstein nas nossas vidas

Alexandre Magno Teles
11 min readDec 29, 2016

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Einstein mudou nossa visão sobre o universo, tempo e espaço. Experimentos mentais (como dos gêmeos astronautas), teorias matemáticas e a grande comprovação da teoria da relatividade geral por meio do mais famoso eclipse solar de 1919, mostraram que o tempo e espaço são relativos a um referencial, e não absoluto como foi descrito por Newton. Além do mais, a luz tem uma velocidade constante e por este motivo o tempo e o espaço são as variáveis em questão, distorcendo completamente nossa visão normal da realidade, onde até então pensávamos que o tempo é absoluto.

Mas o que eu tenho a ver com isto?

Minha vida continua a mesma depois desta descoberta? Ela não altera em nada a minha forma de viver e como eu vejo o universo, não é mesmo? Altera, e muito! Sabemos que para sentir os efeitos da relatividade precisamos estar com aceleração muito além das que enfrentamos no dia a dia para sofrer os efeitos do tempo dilatado. Pois a dilatação do tempo precisa de aceleração considerável e próxima da luz para sentirmos de fato os efeitos da dilatação do tempo.

Porém, várias consequências indiretas da relatividade e suas mudanças sutis afetam nossa percepção da realidade e podem ser aplicada no âmbito biológico e da evolução.

Não precisamos entender a fundo toda complexidade desta teoria e o quanto ela mexe com nossa realidade, apenas temos de entender o postulado base: o tempo é relativo!

Mas o que isto significa?

Somos todos parte de um sistema de referência relativo um ao outro que, no fim, é relativo ao campo gravitacional onde estamos imersos. Não apenas somos parte, como cada um de nós, seres vivos e matéria, temos nosso sistema de referência e o tempo passa diferente para cada um de nós que sofre variações de velocidade, ou seja, uma aceleração muito diferente da sua. Não percebemos isto no seu coleguinha, pois estamos sofrendo a atração gravitacional da terra em conjunto, que tem lá sua medida aproximada de 9.8 metros por segundo. Essa regra não vale só para você, para mim ou para qualquer energúmeno em marte, vale para todo o universo!

Nosso sistema de referência também afeta nosso cérebro. Com a evolução da nossa consciência, formou-se um tempo interior, o chamado I-time em que medidas subjetivas nos confundem na medida do tempo vista do lado de fora (nossos relógios) e temos a sensação de que o tempo passou mais rápido ou mais devagar em certas circunstâncias em relação ao tempo que consideramos universal.

De acordo com Richard M. Pico, em Consciência em quatro dimensões (Consciousness in Four dimensions), assim como a gravidade é uma força que atua na matéria no nosso sistema de referência em comum, a vida e a consciência são novas dimensões relativas formadas a partir dos processos biológicos e o da evolução do pensamento.

Consciência em quatro dimensões é um livro de Richard M. Pico que aplica a teoria da relatividade nos processos biológicos. Foto: Alexandre Magno — Copenhagen, 2016

Idéias revistas

Copérnico, o primeiro que esboçou o movimento dos planetas, começou a tentar entender a dinâmica do universo, mas ainda sim estava limitado a visão da Igreja em que a terra era o centro de tudo. Isto já esboçava nossa intuição de achar que nosso referencial é o centro do universo e estávamos longe de entender que tudo depende de um referencial.

Logo depois, Newton veio com seus princípios de força e gravidade. Suas observações e formulações matemáticas tinham até então refletido com bastante fidelidade a natureza da força gravitacional e da dinâmica dos planetas.

Esta idéia da gravidade como força de cada partícula de matéria tinha como base sua atuação instantânea a grandes distâncias. Sendo assim, de acordo com esta teoria, a terra, por exemplo, saberia o quanto de força gravitacional ela iria imprimir em outros objetos. Havia algo de inconsistente com esta teoria e Einstein teve a visão de um universo e sua natureza melhor “documentado”, onde a gravidade não atuava como uma força instantânea, e sim como um campo que poderia causar deformação no espaço-tempo.

Nicolau Copérnico, um dos primeiros a descrever uma possível configuração da Terra em relação ao sol. Isaac Newton, tempos depois, mostrou que a configuração dos planetas e a referência em relação ao sol funcionavam bem diferente do imaginado por Copérnico, onde o sol não era mais o centro do universo. Foto: Alexandre Magno, Museu Thorvaldsen, Novembro de 2016, Copenhagen, Dinamarca

As mudanças na escala do tempo só podem ser medidas ou sentidas relativamente a outro sistema de referência ou no sistema base no espaço-tempo. A dimensão se contrai de acordo com a direção da aceleração. Não há mudança que possa ser determinada dentro do sistema que está em movimento, pois todos subsistemas dentro do sistema em movimento estão passando pela mesma transformação.

A medida que a aceleração aumenta, o contar do relógio, assim como os processos biológicos se tornam mais longos e assim o tempo passa mais devagar para quem está contido e passando pela aceleração deste sistema. Vale lembrar que o tempo fica mais devagar em relação ao outro referencial. Temos sempre que comparar entre dois referenciais. É isto que a teoria diz a priori. Com a aceleração dilatando o seu tempo, seus processos biológicos, reações químicas, como os processos cerebrais também não seriam afetados?

A gravidade não é mais uma força vista por este âmbito, mas sim um campo — uma propriedade dentro de um sistema em quatro dimensões em um movimento relativo. A gravidade então é um campo atuante sobre a matéria, a vida um campo atuante sobre os seres vivos e por consequência o pensamento um campo atuante sobre a consciência.

Relatividade nos seres vivos

A terra cria uma deformação no espaço-tempo devido à sua grande massa e efeito da gravidade. Dentro dela, todos os componentes que coletivamente acrescentam massa total a ela têm uma mesma taxa de aceleração no vácuo. Assim, dois corpos, como uma pena e peso pesado cairão juntamente no solo se forem deixados em queda livre.

A deformação que o campo gravitacional da terra causa no espaço-tempo. Foto: Pinterest: https://br.pinterest.com/pin/374291419011850714/

Sendo assim, o campo gravitacional e a deformação do nosso planeta no espaço-tempo dita os limites dos processos metabólicos, divisão celular, até mesmo o metabolismo dos nossos neurônios e também a velocidade e eficácia da geração de novos pensamentos pelo ser humano. A gente tem esta capacidade de pensamento baseado nesta dinâmica.

A entropia da informação na evolução dos seres vivos, sua ordem e padrões de desenvolvimento em termos de matéria e energia em todos níveis de organização são derivadas de um contexto de coordenadas no espaço-tempo.

A estrutura das informações são dinâmicas e cada momento no tempo determina a energia formada na referência local. A forma de organização determina o próximo momento do comportamento de toda matéria e energia num sistema em movimento. O mundo vivo existe dentro deste contexto de informação criado entre a referência local e a referência onde ela está contida, que determina e dita o próximo segundo de vida de cada organismo vivo. Um novo sistema de referência surgiu como evolução da complexidade em que os processos metabólicos foram gerados de forma individualizada em seres multi-celulares. Este novo sistema é a consciência humana.

A relatividade que emergiu no ser humano devido a sua capacidade neural deu a ele uma grande vantagem evolutiva: armazenamos em nosso cérebro informações sensoriais que nos permite conhecer todos os processos da biosfera e da vida. Temos uma “foto” de segundo a segundo das quatro dimensões: eixo x, eixo y, eixo z e o tempo na ordem de milissegundos.

Relatividade e seu cérebro

No campo da relatividade na consciência, podemos notar que pensamentos são informações derivadas de fontes internas e externas de matéria e energia. São os padrões mais complexos do universo. Nosso lobo frontal, adquirido com a evolução e que possui capacidade de sintetização mais elaborada, nos distanciou ainda mais dos primatas. Esse poder foi capaz de traduzir todas formas complexas de interação entre sentidos para propagar pensamentos e armazenar memórias únicas em cada ser humano.

Precisamos de um cérebro saudável para produzir nossa dimensão interna no espaço-tempo. Mas vemos que casos como da Hellen Keller, que mesmo surda e muda conseguiu demonstrar todo desenvolvimento consciente do mundo ao seu redor, mesmo tendo perdido os sentidos (audição e fala) quando ainda nem havia completado dois anos. Este caso demonstra que a falta dos sentidos, devido a algum trauma, não pode nos privar de gerar pensamentos ou até mesmo sentir os efeitos do tempo e da relatividade inerente a cada ser consciente, mesmo privado dos sentidos.

Nosso cérebro é um sistema referencial para a consciência, que produz informações em 4 dimensões (pensamentos) que é propagado numa dimensão temporal.

Relatividade e o ser humano: estamos presos numa quarta dimensão

Por mais que tentemos por nossa força de vontade sair deste espaço-tempo, alterar o passado, viajar para o futuro sabendo dos horizontes que a teoria da relatividade abriu, também descobrimos nossa limitação sobre chegar a velocidades próximas às da luz.

O sistema de referência da consciência, como o da vida, não produz uma nova força controlando todo comportamento. Não há uma força vital ou mental. As nossas percepções, sensação e sentimentos de força de vontade, intenções e controles são geradas do referencial mental, que é capaz de se deslocar no passado, e que pode se confundir com o presente.

Nós presenciamos um mundo interno e externo em uma referência em 4 dimensões privada, seguindo momentos de um tempo I-time, em que informações sensoriais nos levam a geração de uma existência subjetiva, sentidas apenas por nós.

Apesar de ser algo individual, assim como o campo gravitacional se deforma no espaço tempo, acredito que as forças do nosso pensamento alteram o fluxo dos pensamentos de outrem, dependendo do nível de interação. No entanto, diferente das medidas inerentes à força sobre a matéria, a força psíquica não pode ser medida, pois estão fora do nosso campo de observação, diferente dos fenômenos físicos que ocorrem no campo referencial de nosso alcance.

Deve ser por isto que temos a sensação de que o bem atrai o bem, que a felicidade conjunta vem de diferentes ações coletivas, positivas. Na verdade isto explica muita coisa, até o tão conhecido sexto sentido feminino. E não há magia nisto. O pensamento usando a relatividade como base pode explicar muitos fenômenos não-físicos. Por que não? Se Planetas atuam com uma força “invisível” (campo gravitacional) sobre outros de menor massa, e a consciência é também um pano de fundo gerador de pensamento que pode exercer força em outros referenciais conscientes ao redor com maior ou menor impacto, dependendo do campo “consciente”.

Estamos produzindo de algum modo uma ilusão interna de informação no tempo, relativa à informação do sistema em que estamos analisando? Os princípios da relatividade podem confundir bastante nossa cabeça! Tudo bem, se ela já complica quando se fala em matéria, sobre a qual temos um certo domínio, imagina no âmbito que foge nosso controle: o campo mental. Vou falar a seguir um pouco destas ilusões que nos limita a tentar enxergar por este campo e estudá-lo mais a fundo.

Desde criança

Animismo, centrismo, antropomorfismo, e causa-efeito são relações que definem a ilusão da nossa existência nos âmbitos do pensamento e da consciência. Cada criança descobre o mundo e inventa suas leis durante seu desenvolvimento. Ilusões e erros recorrentes de informação são parte da progressão e refinamento do nosso entendimento do mundo, até atingirmos uma maturidade do aprendizado e da consciência e pensamento. Até os dois anos, ainda estamos formando e amadurecendo o nosso pensamento e diversas pesquisas (como os trabalhos de Piaget sobre o comportamento das diversas fases da infância) revelam que neste período o cérebro de uma criança se aproxima bastante ao de um primata. É a partir do terrible twos (terríveis dois anos) que a criança passa a formar um sistema próprio de referência e passa a contrariar decisões dos pais. Ela ainda não percebe o poder do pensamento que ela possui é na verdade a formação do self.

Somos um sistema único de referência

“One individual truth is another’s illusion” Richard M. Pico

Como dito acima, uma verdade individual é a ilusão do outro. Cada sistema de referência de um ser humano é um campo de referência relativo a outro ser, e por isto nunca podemos prever ou conseguir formular idealmente como é o pensamento do outro. Mesmo que cheguemos à mesma conclusão sobre algo banal (como, por exemplo, sobre o que é uma maçã), a imagem abstrata de uma experiência nunca é igual à outra. Vivemos em sistemas de referenciais únicos, compartilhados num mesmo sistema onde a gravidade opera sobre a matéria e energia, o metabolismo opera sobre os seres vivos e o pensamento opera sobre o cérebro, todos em sistemas referenciais diferentes e, por isto, a vida não é capaz de ter consciência e nem nossa consciência consegue enxergar além dela.

Nós não escolhemos respirar, manter o sistema circulatório ou manter nosso batimento cardíaco na frequência correta. O mundo das funções vitais não é objeto do sistema de referência da consciência. As funções vitais não são objeto do nosso livre arbítrio. Eles fazem parte do sistema de referência inerente à vida onde a sua principal variável é o metabolismo.

O universo de Einstein e nossos limites do pensamento

A complexidade inerente do universo é tão incrível que nós apenas conseguimos observar a sombra da sua estrutura e função. Com a relatividade, Einstein concebeu buracos negros e ondas gravitacionais. Conseguimos imaginar o limite do universo, para uma única constante c.

Quando chegarmos perto de c, nossa massa se tornará infinita, nosso tamanho na direção da aceleração se tornará zero, e o intervalo de tempo entre cada batida dos nossos processos biológicos se tornarão infinitos. No âmbito dos experimentos mentais, conseguimos projetar isto.

O que podemos concluir disto tudo é que a relatividade chegou nas “barreiras do universo” e que vivemos no plano de uma dimensão em que torna inalcançável atingir e observar de forma direta outras além das que estamos imersos.

Não podemos ter outra perspectiva dentro da nossa própria perspectiva. Chegaremos sempre em recorrência e elas aparecem em todas formas de manifestação: linguagem, arte e até na computação.

Não podemos pensar além da existência em quatro dimensões onde a gente foi criado, e qualquer dispositivo que nós inventamos irá dar de cara com uma barreira termodinâmica em algo que irá se colapsar em uma forma em que conseguimos integrar nos nossos processos neurais do lobo frontal. Ou seja, iremos traduzir tudo nas 4 dimensões conhecidas.

Carl Sagan explica isto muito bem neste vídeo. Se nossa existência fosse num plano de duas dimensões, o que viria de uma terceira dimensão seria algo vindo de outro “planeta”.

A nossa fronteira termodinâmica é talvez o que define nossa dualidade, a natureza histórica da separação mente e corpo. Quando chegamos no limite do pensamento com o corpo, temos por intuição a sensação de que a mente está “fora”. Isto não acontece por acaso.

Com a relatividade e perspectiva sobre nossa sobrevivência num sistema de referência único em quatro dimensões, fica muito difícil tentar formalizar uma definição completa de consciência, pois não temos outro sistema de referência para ver a perspectiva do pensamento através dele, assim como temos a referência dos processos vitais da vida que conhecemos e estudamos.

O ser humano é parte de um todo, chamado por nós de “Universo”, uma parte limitada no nosso espaço e tempo. Ele experimenta seus pensamentos e sentimentos como algo separado do resto — um tipo de desilusão ótica da sua consciência. Sua desilusão é um tipo de prisão pra nós, nos restringindo aos desejos pessoais e afeições por pessoas próximas de nós. Nossa tarefa é nos libertar desta prisão abrindo nosso círculo de compaixão para abraçar todas criaturas vivas e toda a natureza e sua beleza. Ninguém é capaz de fazer isto completamente, mas se aproximar desta conquista é por si só parte de uma liberação e base para sua segurança interna.
Albert Einstein

A contagem do tempo como conhecemos agora está inteiramente interligada com a nossa consciência, como instrumento para medir a passagem do tempo. A partir do momento que começamos a ter consciência do passado, presente e futuro, tivemos que encontrar uma forma absoluta de retratar as passagens do tempo e seus diferentes ciclos relacionados às estações e temporadas, em diferentes unidades. Foto: Frederiksborg Castle, Alexandre Magno, Novembro 2016, Copenhagen, Dinamarca

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Alexandre Magno Teles
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Written by Alexandre Magno Teles

Citizen Scientist and Software Engineer, looking for the limits beyond mind and machine exploring the world

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